09
outubro
2017

Em algum lugar do mundo eu tinha razão

Postado por Ana em Alemanha, Coisas da Ana

Olhem só a história. Lá estava eu com 3 ou 4 anos de idade (sim, eu me lembro de TUDO) na cama da minha mãe com minha irmã. Nós tínhamos o costume de assistir Moranguinho e A Noviça Rebelde, tipo mil vezes e repete – coisa de criança, né?! Daí que em um desses momentos, não sei como, afirmei que segunda-feira era o primeiro dia da semana. Para mim era tão óbvio isso – era o dia que a escola começava. Minha irmã, como sempre bem-sabida, já foi logo dizendo que eu estava errada e que domingo era o primeiro dia da semana. Eu lembro que achei aquilo tão absurdo! Repeti que ela estava errada e quando a mamãe voltasse ela ia concordar comigo. Pois eis que mamãe volta e diz “na verdade o primeiro dia da semana é domingo“.

Quem vê minha cara agora não imagina a capeta que eu era. Quando ouvi isso iniciei um dos meus memoráveis pitis, chorei, dei um dos meus pulos de 1 metro de altura, e dizia “VOCÊS VÃO TEERRRR QUE FALAAAAR QUE É SEGUNDA! É SEGUNDA! É SEGUNDA!”.

Gente, essa cena foi marcante num nível que eu nunca esqueci. Pois embarquemos no tempo e uns 25 anos depois: já residente neste país das salsichas, por um acaso vejo que por aqui o primeiro dia da semana REALMENTE é segunda-feira. E mais: não somente na Alemanha mas em vários outros países do mundo (na Europa quase toda) e mais: segundo a definição do ISO 8601, segunda-feira é o primeiro dia da semana! Rá! A definição de domingo como primeiro dia é típica de calendários hebreus e cristãos tradicionais.

Já tem uns anos que sei disso, mas lembro a lavada de alma que foi! rsrsrs

Curiosidade 2: a lua também muda

Isso eu percebi há relativo pouco tempo enquanto marido e eu observávamos a lua. Eu notei que algo não estava batendo: o que eu aprendi como lua crescente ele estava chamando de minguante. Daquela coisa bem básica que a gente aprende com a tia da escola, sabe? E quando olhamos no google descobrimos que o formato da lua crescente e decrescente muda se você está no hemisfério norte ou sul. E do equador ela também é diferente. Agora me parece óbvio, vocês podem estar me achando bocó, mas nunca tinha pensado nisso. Talvez por eu não ser muito ligada em astrologia, tipo, achei que era touro grande parte da vida, sendo que era áries, kkkkk!
No Brasil, a luz com forma de “c”, é crescente e com forma de “D” é minguante. Aqui tem uma regrinha também, a lua com formato de “a” cursivo (seria a curvinha do nosso C) é minguante (“abnehmend”) e com formato da parte de cima do Z cursivo (esquivalente ao nosso “D”) é crescente (“zunehmend”). Ou seja, tudo ao contrário. Já no equador a lua está meio deitada e aparece como uma barca ou arco.

regrinha no Brasil

regrinha na Alemanha

Curiosidade 3: preencher envelope é diferente

Eu sei que já deve ter gente em pânico com meu post e vou piorar mais um pouco! Mas lembram quando a gente aprende na escola a preencher envelopes bonitinho? Remetente aqui, destinatário acolá. Pois pasmem! Isso também é diferente aqui, olhem só meu esqueminha:

Está explicadinho na página dos Correios alemães, a Deutsche Post!

Engraçado que aprendemos verdades absolutas na infância e daí do nada, basta mudar um pouco o ponto-de-vista que tudo muda. Isso me deixou pensativa – primeiro, a gente nunca deve aceitar verdades sem procurar saber por conta própria. Segundo, a gente tem que ter cuidado em tomar “verdades” como eternas. E terceiro, vou plagiar o Steve Jobs: “stay hungry, stay foolish“. O mundo está lotado de conhecimentos invisíveis aos nossos olhos … podemos obtê-los se nos mantermos abertos a eles!

Beijos!

01
setembro
2017

Meu cantinho de estudos e mais

Postado por Ana em Coisas da Ana

Vi nesse instagram aqui esse desafio fotográfico, mas como eu gosto muito mais do meu blog do que do instagram, resolvi fazer um post respondendo tudo de uma vez! 🙂 Acho que 99% das pessoas que participam de coisas de studygram são mais novas do que eu, então pode ser interessante ver essas coisas do ponto de vista da anciã aqui! kkkkn Respondam vocês também, pelo menos algumas, ok?!

1) Como minha letra é

Varia com a pressa e o humor, mas minha letra “padrão” é assim. Esse caderno é de 2012!

2) Meu cantinho de estudos

Eu acho que esse é meu lugar favorito no mundo inteiro. Pena que me sobra tão pouco tempo para ficar aí.

3) Livro não-teórico favorito Leia mais…

28
julho
2017

Minha cidadania alemã (por casamento)

Postado por Ana em Alemanha, Coisas da Ana

Tenho umas “boas novas” pra contar: agora também sou cidadã alemã! Após burocracias, papeladas, acusações de fraude e tudo mais, o passaporte tá na mão! Contei tudo no vídeo abaixo, mas pra quem “é de texto”, tem texto também! 🙂 Ah, abaixo estou misturando conceitos de nacionalidade e cidadania de forma bem grosseira – sei que juridicamente são conceitos diferentes mas por favor cut me some slack 🙂

Motivos para a nacionalidade

Na verdade eu nem precisaria de muitos motivos, para mim “por que não?” já seria o suficiente. Em qualquer outro país que eu estivesse morando ia querer sim a nacionalidade, claro. Mas motivos práticos não faltaram ! Isso é um grande facilitador da minha vida por aqui. O motivo número um é que isso significa que possivelmente nunca mais vou ter que ir no setor de estrangeiros da cidade. Parece uma bobagem, mas aquele lugar virou um inferninho após a onda de imigração: para coisas bobas como pegar meu titulo de permanência eu já cheguei a ficar 4 horas em pé. E o pior é que os horários são totalmente incompatíveis com quem trabalha. Eu já tive que tirar vários horários de férias para resolver besteiras, e ninguém merece , né?

Além disso agora tenho o passaporte alemão o que me permite ignorar a fila pro “resto do mundo” nos aeroportos aqui e passar direto na catraca da EU. E ficar na mesma fila com meu marido, sogros. EDIT: me disseram que dá para fazer isso com o cartão de permanência, procede? E ter que responder menos perguntas na Inglaterra (apesar de não pertencer mais à EU. Meu marido sempre passou quase direto e eu tinha que ficar respondendo mil perguntas). E poder entrar nos EUA só com o ESTA. Aliás, a primeira coisa que fiz quando peguei meu passaporte foi desmarcar minha entrevista pro visto americano em Frankfurt. Olha que prático! Dizem que em termos diplomáticos o passaporte alemão é o melhor do mundo. Teve até um ranking ano passado:

Além da economia de não ter que ficar renovando visto, da independência de não precisar ir com meu marido para essas coisas. Eu DETESTO depender de marido para qualquer coisa e até hoje para qualquer coisa relativa à minha permanência ele tinha que ir junto. E sensação de liberdade pro caso de eu precisar ou querer ou pirar e ir pro Brasil e me arrepender depois eu posso voltar quando bem entender: independente de casamento, de emprego, de nada. Não que eu vá pirar, mas como disse, aprecio a liberdade. Sempre vou poder ficar por aqui se assim o quiser. E claro: também vêm os direitos e deveres como ajudas de governo (que eu obviamente nunca quero receber), votar se me der na telha, etc!

Resolvi tirar a nacionalidade assim que preenchi os pré-requisitos de tempo, por motivo de: MEDO das regras mudarem. Seja de aumentarem o tempo necessário de residência, seja mudarem as regras da dupla cidadania. Esse tipo de coisa eu sempre faço o mais rápido possível pra não me chutar depois!

Mas eu não tinha cidadania sendo casada com alemão, como assim?

Muita gente confunde duas coisas totalmente diferentes: uma é o visto e a permissão de residência. Outra coisa é você ter a nacionalidade de um país, e com ela a cidadania: ter passaporte, poder votar, etc. Quando você casa com alguém daqui você logicamente vai ter direito ao visto por casamento – mas nem isso é automático. Tem que levar documentos, ir com o marido e renovar de tempos em tempos. Para a cidadania existem vários pré-requisitos, inclusive de tempo de moradia – acho que em país nenhum você ganha cidadania por casamento. Tipo, se meu marido quiser ser brasileiro agora ele não consegue, porque teria por exemplo que morar no Brasil. Ao contrário do Brasil, aliás, a Alemanha usa o critério de ius sanguinis para a nacionalidade, ou seja: NASCER aqui não garante a nacionalidade. Por exemplo, filhos de casal turco que nasceram e cresceram aqui só são alemães se entrarem com pedido E se abdicarem da nacionalidade turca!

Dupla nacionalidade

Essa é uma grande dúvida porque várias nacionalidades devem optar entre a alemã e a própria. Esta é inclusive uma regra standard na hora de tirar a cidadania alemã: abdicar da sua. Mas claro, há exceções: tipo países da UE, Suíça e… Brasil! A nacionalidade brasileira nunca é automaticamente perdida e você só perde se entrar com um processo de livre e espontânea vontade para perdê-la! Fiquei com medo de não saberem disso mas a mulher estava bem informada e logo disse que eu teria dupla nacionalidade e foi me explicando as implicações disso. Por exemplo, se eu tiver um pepino no Brasil o consulado alemão só consegue me ajudar parcialmente. A gente faz uma carinha neutra como se tivesse #chateada mas no fundo tá pulando de alegria. Porque NAONDE que eu ia desistir da minha nacionalidade brazuca?? Impensável ser estrangeira no meu próprio país e isso eu não faria nunca. Se deixar de ser brasileira fosse pré-requisito eu ia passar a vida inteira nessa chatice de setor de estrangeiros sem nem titubear. EDIT: no formulário, quando pergunta se você está pronta para abdicar da sua nacionalidade, você marca NÃO!

Pré- requisitos

De forma bem resumida: se você mora na Alemanha você tem direito a entrar com o pedido da cidadania após 8 anos. Há exceções: quem frequentou curso de integração ou traz vantagens ao país (super integrado) consegue com 7 anos. Quem é casado com cidadão alemão precisa morar há 3 anos aqui e estar casado há 2! Além disso você precisa de um certificado de língua mínimo B1, de preencher um formulário gigantesco e de levar um currículo tabelar (coloquei o modelo do meu aqui), foto e vários outros documentos dessa lista (atenção: consultar a própria cidade, pode variar!) em original e cópia. A certidão de nascimento e casamento do Brasil têm que ser traduzidas juramentadas. Isso fiz com um tradutor da minha cidade (aqui) para ir mais rápido. Dentre os documentos: contrato de trabalho do marido e meu, contracheque dos últimos 3 meses meu e do marido, passaporte do marido, contrato de aluguel, prova de contribuição ao “INSS” daqui, etc etc! Você também leva uns arquivos impressos para assinar lá na hora, basicamente dizendo que você não é terrorista, he he he. E, claro, paga 255 euros – isso não inclui os custos que terá depois com passaporte e ID.

O que eu notei nesse processo é que o importante para Alemanha é que
1) Você não seja terrorista
2) Você não seja criminoso: se já foi condenado por crime, tá fora
3) As chances de você dar prejuízo financeiro ao país seja baixa. Eles não querem te financiar!


O processo

Por isso é perguntado no formulário se você já recebeu ajuda do governo e por isso pedem tanta confirmação de renda e trabalho. Sei que tem gente que consegue a cidadania apenas mostrando que o marido pode sustentar. Mas eu nem tenho idéia como seria na hora que você vai entregando a papelada e não tem confirmação de renda etc. Tá tudo na lista lá, e não tem escrito “opcional”. Jeito deve ter mas acho que atrasa bastante o processo.

Daí logo antes de completar o tempo já marquei minha provinha na Volkshochschule. Sim, tem uma provinha de 33 questões sobre política, história, etc, se chama Einbürgerungstest. Mas tem vários apps com as 330 questões possíveis para você estudar e ainda pode errar um bocado – maior mamata, não precisa ter medo da prova. Daí o resultado chega por correios 3 semanas depois. Daí assim que recebi o resultado da prova eu liguei para marcar um horário para entregar a papelada. O problema é que por causa do meu trabalho tudo tem que ser com mega antecedência (desmarcar pacientes!) e eles também não têm muitos horários à disposição. Então esperei quase 3 meses para ter meu horário pra levar tudo. No dia de levar os documentos lá fui eu com 1kg de papel, tudo neuroticamente conferido e na ordem da Check-List, em plásticos individuais. Apesar disso era tanta coisa que estava meio tensa de ter esquecido de algo, afinal eu não teria outro dia para voltar. Fui com hora marcada e daí a mulher começou a conferir o big formulário linha por linha. Daí de repente ela vira para mim e diz “aqui, você marcou que nunca respondeu a um processo mas em 2014 você estava em Lörrach e foi acusada de blablabla fraude na Alfandega blablabla“. Gente eu queria uma câmera para ver minha cara nessa hora. Sabe cara de avestruz olhando pro lado?

                                                                   Eu sendo acusada de fraude

Tipo Didi Mocó: ACUMA????. E eu disse : “an? Eu nunca estive em Lörrach, como assim?” E na minha cabeça passando as coisas mais absurdas. Insisti que não sabia de nada e perguntei se ela poderia checar de novo. Daí ela me mostrou a tela do computador e lá estava Ana Christina não sei de que, nascida na década de 70, em Portugal. E eu disse : “olha, não sou eu, é uma portuguesa!”. E ela: “ah, tá“. Nem pediu desculpa, me acusou de fraude (Betrug, palavra que sangra meus ouvidos) assim na lata e ficou por isso mesmo. E pode colocar isso na lista de vantagens de não ser mais estrangeira no papel – um alemão nunca que ia aceitar isso. Mas eu fiquei quietinha, né, porque senão bye bye cidadania. Mas daqui para frente jamais vou aceitar algo assim sem ao menos dar uma puxada de orelha de volta. Então segui mostrando os documentos e entregando as cópias, um a um, e ela até disse que eu “estava incrivelmente bem preparada”. É, EU ESTOU né, você não, Creuza. 🙂 No fim disse que da parte deles o processo demorava uns 3 meses mas que tinham que checar com vários setores , então poderia demorar mais. Mas ok, entreguei e esqueci.

Chegou rápido

Qual não foi minha surpresa quando duas semanas e meia depois chego em casa e tem uma “cartinha suspeita” da cidade? Meu marido estava me aguardando para abrir, até meio preocupado porque quando é tão rapido é porque deu algum biziu. Daí abrimos e era uma cartinha falando que estavam felizes em informar que meu pedido tinha sido aceito e que DESDE que as condições informadas por mim não tenham se alterado, principalmente as ECONÔMICAS ($$$$$), eu teria que ir lá no dia X no horário X com meu marido para pegar o documento de cidadania. Daí foi um Deus-nos-Acuda, como assim uma semana de antecedência em horário UTIL? E logo na quarta quando trabalho a uma hora da minha cidade. Consegui desmarcar 2 horas de pacientes e saí em disparada para o horário (último, I hope) nesse setor de estrangeiros. Encontrei com meu marido, levei uns documentos assinados que recebi junto com a cartinha e lá conferi o documento, a mulher carimbou. Tive que repetir a seguinte frase em voz alta:

Ich erkläre feierlich, dass ich das Grundgesetz und die Gesetze der Bundesrepublik Deutschland achten und alles unterlassen werde, was ihr schaden könnte”

 

Em tradução livre: “prometo não ferrar com a Alemanha”. kkkk Eu, perfeccionista como sou, já tinha visto na internet que leria isso e treinei a frase para pronunciá-la o mais lindamente possível. 🙂 #ANA-CRISTINA-A-LOUCA

Daí ela me disse que a partir daquele momento eu era cidadã alemã e me deu parabéns. Nessa hora me deu um nó na garganta. Não pelos motivos pelos quais eu queria essa nacionalidade. Não por felicidade nem por tristeza, mas um nó na garganta de constatação mesmo. Eu não me canso de admirar o quanto a vida é essa coisa bela, imprevisivel e até irônica. Eu jamais poderia imaginar que as coisas tomariam esse rumo quando sentei lá na minha primeira aula de alemão em 2003, interessada unicamente em aprender uma nova língua. É bom, mas é estranho.

Não acho que isso possa ser considerado uma “conquista” porque tudo que fiz foi uma provinha boba, xerocar, organizar documentos e preencher pré-requisitos. Mas é mais um milestone por aqui e por ele sou grata!

Beijos da alemãzinha que fala uai

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