18
setembro
2016

Lavar salada na Alemanha e os expatriados de nariz em pé

Postado por Ana em Alemanha, Ana de Casa, Coisas da Ana

Lembro que quando eu era criança, lá em casa lavávamos vegetais com vinagre e creio que assim foi em muitas casas também. E talvez ainda seja assim em muitos lares. Lembro depois de descobrir que o vinagre não era adequado a esse fim. Até mesmo na faculdade lembro de ter reaprendido isso. O hipoclorito de sódio sim, esse em diluição própria poderia matar todas as larvas e microorganismos nocivos à saúde. Este último é o que conhecemos como água sanitária. O seu uso para higienização não só não é errado como é o mais recomendado. É importante que esteja na concentração correta de 2,5% , uma colher de sopa por litro e e que seja de uma marca aprovada por órgãos fiscalizadores .

alface

Ou seja, seguindo as recomendações, você não irá exalar uma fumaça verde que nem no livro “A Testemunha Muda” da Agatha Christie nem estará se condenando a um câncer. Melhor preocupar-se com o desodorante que usa.

Eu sempre preferi comprar soluçõezinhas prontas no supermercado. Lá em BH são muito fáceis de encontrar. São tipo a mesma coisa, uma diluição de hipoclorito de sódio, mas acho mais prático e trazer e de seguir as instruções da embalagem (tipo meia tampinha por litro). Acostumei a trazer garrafinhas com essas soluções do Brasil porque não via aqui algo parecido. Aí, hoje, a três semanas da próxima visita à terra Brasilis, acabou meu estoque e fiquei aqui na dúvida com minha alface. Não tive coragem de usar o equivalente da água sanitária daqui porque não sabia se era própria para esse fim, se tinha algo a mais que a nossa, enfim. E nesse caso, melhor ter certeza, né?

higienizador

Ou seja, eu não vou morrer envenenada se lavar meus alimentos como o Ministério da Saúde propõe. A não ser que haja um plano secreto pra dizimar os brasileiros.

planosecretoPlano secreto do Ministério da Saúde pra dizimar a População brasileira #sqn

A higienização com hipoclorito de sódio a 2,5% é indicada pelo ministério da saúde do Brasil. É a forma que os engenheiros de alimentos indicam. Mas ainda assim, há quem só acredite na Rede Globo, então tó o link pro Jornal Hoje.

hoje

Diferença cultural Brasil e Alemanha

Os alemães, em sua maioria, têm o hábito de lavar vegetais só com água corrente. Em parte, pelo fato de realmente a produção de alimentos ser bem mais controlada aqui, bem como por não ser um país tropical, onde ovos de Ascaris e afins sempre encontram uma dificuldade maior para completar seus ciclos, graças aos meses frios de inverno. Tem a questão cultural também, o apreço por coisas mais naturais possíveis. Conheço alemães que ficam até meio aliviados de descobrirem larvinhas inócuas no alimento e suspiram “ótimo! Significa que não tem agrotóxicos“. Ou como minha sogra que se disse cheateada ao colher uma framboesa sem bicho, pois essa é uma fruta muito amada pelos bichos e “se não tem nenhum, é porque tá lotada de agrotóxicos. Ótimo, não estou aqui para julgar a cultura de cada um e tampouco as preferências que cada um tem para sua saúde!

Toma, distraída

Lá vou eu toda inocente no facebook antes de iniciar meu almoço dominical para pedir dicas de como higienizar minha alface. Tem muita comunidade útil no Facebook, e atualmente o uso só para isso: línguas, receitas e dicas de Alemanha. Entre um trilhão de outros, eu fazia parte de um grupo sobre dicas de limpeza de casa por aqui (que até já citei no blog) mas nunca tinha pedido ajuda. Até porque atualmente eu tenho pouquíssimas dúvidas, me considero uma dona-de-casa nível pro! 🙂 Pois vocês acreditam que meu post pedindo dica de produto similar aos do Brasil para tal fim (e perguntando se o análogo da água sanitária aqui era igual ao do Brasil) começou a virar um show de baixarias? Teve senhorinha mal-educada me mandando “me matar com cloro, então”, assim, de graça. Deixei o tópico rolando até que uma troglodita gratuitamente me soltou algo como “por isso não gostam dos médicos do Brasil“, daí achei por melhor apagar o tópico e me retirar de grupo com gente tão hostil. Lembrei também que meu blog serve pra isso também e sei que tenho muitas leitoras expatriadas queridíssimas que poderiam me dar dicas.

bitchplease

Em menos de uma hora, catei tipo UMA dica dentre um mar de gente horrizada porque eu “ia morrer envenenada“. Algumas outras mais educadas que simplesmente não concordam comigo e fazem como os alemães e lavam só com água corrente. Algumas outras estavam igualmente espantadas com a “minha ignorância”. Sendo que a única coisa que fiz foi educadamente pedir dica de produto. o.O Sério, minha boca foi ao chão.

Porque EU quero higienizar os MEUS alimentos com mais do que água

Até que, para “me defender”, mencionei que minha preocupação não eram larvas mas sim o Toxoplasma. Daí argumentaram que na “Alemanha num tem essas coisas não”. Talvez não saibam que esse protozoário é ubíquo e encontrado em todo mundo. Meus pacientes com toxoplasmose ocular estão aí para provar. Li também a opinião de que isso seria um azar como andar de avião e que o risco é baixo e melhor deixar pra lá. Além de não concordar que o risco seja tão baixo, cada um escolhe os riscos que quer correr. Eu sou suscetível a toxoplasmose, o que significa que meu IgG é negativo e não tem quem me convença a comer uma folha não-higienizada quando eu estiver grávida. Quem teria que cuidar do neném mal-formado, seria, afinal, eu né? Nem todos os riscos são evitáveis na vida, mas o que são e têm a ciência do lado eu vou correr pra que? Também não quero entrar na loteria. Sim, 30% da população mundial é IgG+ pra toxo. Desses, poucos têm um azar de o toxoplasmose ficar reativando, na retina por exemplo. Mas poucos de 30% é gente pra caramba, o que torna sim a toxoplasmose um problema mundial. Você não é obrigado a saber disso, mas daí a fazer chacota com quem sabe? Eu sei que aqui na Alemanha tem menos que no Brasil e o sorotipo costuma ser menos agressivo. Mas tem. Ah, tem sim Senhor. E eu quero continuar me prevenindo e o direito é meu.

toxoscarCoriorretinite por toxo: quem já viu não esquece. Quem tem, muito menos”.

A gentileza mandou um abraço

A questão é: se você só quer lavar seus vegetais com água eu não tenho nada a ver com isso. Acho que de forma geral, temos que todos ser mais tolerantes com a cultura alheia. Sei que tá cheio de gente do Brasil lendo esse post e achando os alemães porcalhões. Sei que se tem alguém bem enraizado na Alemanha, este alguém está me achando exagerada. Sei que nesse meio termo o respeito morreu.

Os expatriados reis da cocada preta

Essa situação me fez observar uma coisa que noto ser meio endêmica- os “expatriados” de nariz em pé. Eles se dividem em duas categorias:

1) Aqueles que estão há mais tempo no país X e por isso meio que se acham donos do país. Só eles podem dar dicas, só eles podem opinar. Sua opinião, verdade absoluta. Verdadeiros PhD em qualquer coisa relacionada ao país e ai de quem discordar. No geral suas frases se iniciam com “eu moro aqui há x anos e …“.

2) Aqueles metidos a besta mesmo, que acham que ficaram melhores que os brasileiros porque moram fora. Que assimilaram alguns aspectos culturais do país onde estão e se voltam com ar de superioridade aos compatriotas. Eu mesma já adquiri vários hábitos daqui, alguns mesmo em termos de futuro como criação de filhos. Mas vocês não me virão enfiando dedo na cara dos brasileiros porque escolhem fazer isso assim ou assado.

Humildade, people, humildade.

Esse post é, no final das contas, para pedir dois tipos de dicas: como vocês higienizam as saladas fora do Brasil (caso não seja só com água) e como vocês fazem para lidar com esse tipo de gente. Desde que eu me mudei, esse blog é também para dividir dicas com quem está em situação parecida – e vocês podem sempre contar com minhas dicas quando eu souber. Pode ter certeza que não vou te julgar nem xingar quando você pedir ajuda. Aliás, quem me segue no Snapchat (anacris.lc) já deve ter notado que vido dando dicas de casa, tem até a série #Ana-de-casa! :))) O importante é nos ajudarmos.

Beijos !

12
abril
2016

24 coisas em 24 meses de Alemanha

Postado por Ana em Alemanha

Hoje estou completando dois anos de mudança “oficial” para a terra da salsicha! É inevitável pensar no que gosto, no que não gosto, nas semelhanças e diferenças. No geral, eu gosto muito de morar aqui e me acostumei bastante com o modo de vida. Já disse que fui assimilando a cultura alguns anos antes de vir morar aqui, então não tive grandes choques. Claro que, vez ou outra, ainda estranho alguma coisa. Tem coisas que não entram na minha cabeça, tem outras que não sei mais viver sem. Faz parte! Estamos carecas de saber que toda generalização é burra, pois as pessoas são diferentes e produto não só da cultura da sociedade em que se inserem mas também da genética, criação, vivências pessoais, estudos. Mas é óbvio que certa sociedade carrega em si uma “tendência”. Por exemplo, eu sou super pontual, “na minha”, não-expansiva. Nem por isso vou falar que é mentira que o povo brasileiro é no geral aberto, expansivo e atrasado. Ou que é mentira que o alemão é mais “distante” que o brasileiro, só porque o marido e sua família não são. Vai da experiência de cada um também. Já que expliquei, não vou ficar repetindo as frases “no geral”/ “geralmente” abaixo, fica subentendido! 🙂 Dito isso, seguem algumas impressões nesses últimos dois anos e “coisas que aprendi” aqui:

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Coisas que aprendi aqui! As minhas impressões pessoais e individuais (redundância proposital):

1) A evitar passar dias de sol em casa e dar todo o valor à primavera e ao verão.
2) Que o motorista alemão é muito generoso/organizado e que eu era – acreditem – super agressiva no trânsito.
3) Que os trens alemães atrasam sim e com uma frequência assustadora na minha opinião. Essa eu REALMENTE não imaginava até quebrar a cara umas 20 vezes.

alemanha1

4) Que os alemães não são nada espontâneos e são péssimos em improviso.
5) Que os alemães são muito educados na arte de cumprimentar e agradecer, ainda que o estejam fazendo por obrigação
6) Que eu amo os supermercados aqui e que, se comparados ao Brasil, são bem mais em conta.
7) Que eu não sinto a menor falta de carne vermelha, ainda bem, porque pode sair bem caro.

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8) Que o trabalho aqui é mais intenso que no Brasil. Se você está sendo pago pra trabalhar de 8 às 17, acredite, você vai dar todo seu suor de 8 as 17! Seja você pedreiro, faxineira, professor, médico, lojista…
9) Que eles são meio resignados, o que fomenta a ~terrível~ mania do “se vira”. A rua acaba de ser bloqueada pra carros. A garagem do seu prédio foi bloqueada, volte amanhã. O trem não seguirá ao destino final hoje. Se virem, galehre!
10) Que alemães são completamente alucinados com natureza e fazer andanças pela mesma é das maiores manias nacionais – principalmente se o tempo estiver bom.
11) Que o povo alemão é essencialmente individualista (não confundir com egoísta). Cada um com suas coisas.
12) Que eles não costumam oferecer as coisas só por educação, mas se oferecem, pode aceitar.

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13) Que eles não relutam em repassar críticas. Não se espera que você leve pro lado pessoal e fique “sentido”. Aguentaaaa, coração brazuca!
14) Que são um povo muito tolerante, ou ao menos fingem ser. Não estou me referindo aos extremistas, mas ao alemão comum.
15) Que são muito menos preconceituosos do que a “fama histórica” que têm. Ser gay, negro ou mulher aqui me parece mais fácil do que no Brasil, mesmo eu só me enquadrando na terceira categoria.
16) Que não é (nem de longe) toda estrada que não tem limite de velocidade, e os congestionamentos nas “míticas” Autobahn nem são raros.
17) Que aqui não se costuma lavar carro aos domingos, mas sim sábados. Até porque os lava jatos costumam fechar aos domingos!
18) Que todos se organizam com as compras já no sábado, pois domingo os supermercados fecham.
19) Que aqui os cidadãos são devidamente cadastrados e tudo é muito bem monitorado. Se você não se cadastra, você meio que não existe naquela sociedade e perde todos os direitos.
20) Que aqui não é comum trabalho “informal” sem pagar imposto como no Brasil. Até existe, mas bem menos, e bem mais arriscado. O leão alemão é implacável.
21) Falando em leão: que se paga uma quantidade absurda de impostos, tem até imposto pra ajudar a alemanha oriental.
22) Que qualquer coisa que envolver mão-de-obra humana será absurdamente mais cara que no Brasil.
23) Que alemães são muito menos rede social e internet-maníacos. Sabem os nossos memes brasileiros maravilhosos? Nossas polêmicas?! A guerra de política em redes sociais? Os celulares levantados nos shows, as selfies, as fotos de comida no restaurante? Facebook, instagram, snapchat? Muito menos frequente aqui.
24) Que a animação do público em shows nem se compara à do Brasil. Dependendo do artista, a platéia só canta junto quando convidada pelo mesmo. Sério, eu já vi isso! Boca foi lá no chão hahaha

Quem mora aqui, me diga se teve impressão diferente em algum ítem.

Beijos!

06
abril
2016

Invernite aguda

Postado por Ana em Alemanha, Coisas da Ana

Eu sempre escutava falar que a escuridão e frio do inverno deixavam as pessoas meio pra baixo. Sinceramente, achava que passaria imune. Em 2014 eu fiquei bastante em casa, então acabava tendo muito da luz do dia para mim, quando bem entendesse. Já 2015 foi o primeiro ano que vivi as 4 estações integralmente. Como a primavera/verão vêm primeiro, acho que não dei o valor que mereciam. Claro – passeei bastante, andei de bicicleta, patins, fui à piscina… Mas lembro de, às vezes, ver a luz do sol pela janela, céu azul, e ficar com preguiça de sair. Até certo ponto do ano passado eu realmente não via diferença entre sentar do lado de fora ou de dentro de um restaurante. Achava engraçado a mania dos alemães de TER que se sentar do lado de fora se for possível. Não é à toa que um dos bares mais tradicionais de Freiburg faliu no verão passado. Foi um longo verão e era um bar só com lugares internos – os clientes simplesmente não queriam desperdiçar os dias de sol tomando drinks sob um teto.

invernoazulPior que são fotos sem filtro.

Quando chegou novembro eu vi meu humor mudar. Nem pelo frio, mas pela escuridão. Sair de casa escuro e voltar no escuro! Realmente também estava trabalhando muito e bastante cansada. Mas com certeza a falta de luz teve seu papel. Dezembro chegou com seus distrativos natalinos mas eu estava realmente bem rebugenta. No dia em que eu fui viajar pro natal no Brasil, saindo do trabalho, eu estava tão sem energia que achei genuinamente que não teria forças para dirigir aquela uma hora até chegar em casa. Sensação de exaustão, a um nervo de um ataque de beiras. À medida que, após o solstício, os dias começaram a claramente se alongar, fui percebendo o quanto aquilo me afetava física e mentalmente. Um raio de luz no caminho para o trabalho me deixava abobada de alegria. E, pouco antes da primavera chegar, o resto de luz após voltar para casa também marcava presença.

tulipas

Eu só sei que a primavera chegou e me sinto outra pessoa, completamente revigorada. As férias ajudaram, é verdade. Mas estava com um bom-humor assustador semana passada. Como ouvi em Friends certa vez, parecia um Papai Noel no Prozac. 🙂 Agora saio e volto na claridade e ainda posso sair passeando com o dia claro. Vi as flores pelo caminho, as primeiras cerejeiras florescendo e até quis chorar de emoção.

inverniteflor

Acho que por toda a minha vida nunca dei valor ao clima privilegiado de BH – tive que viver bem as estações para entender. Acho que um dos maiores desafios da minha vida aqui sempre será aprender a dar valor ao inverno – que deve ter lá suas belezas. Não quero ser uma pessoa que deseja que o mês “X” (a.k.a vida) passe rápido e que está sempre à espera da próxima primavera, sabe? Mas por ora, as únicas vantagens que vejo no inverno são que os insetos desaparecem, fico de meias felpudas e dormir fica mais gostoso! 😉

meiasfelpudas

Aprendi também que tenho que prestar mais atenção aos sinais do corpo e me preparar melhor psicologicamente para o próximo inverno. Diz o marido que se eu aprender a esquiar vou ficar feliz com o inverno. Talvez seja então uma resolução para o próximo. Acho que é importante me preparar fisicamente também – mexer o corpo nessa situação é ainda mais importante e me atentarei mais à isso da próxima vez, já que no fim de 2015 estava sedentária. Bom, me preocupo com isso depois, pois agora teremos longos meses floridos pela frente. \o/

Quem aí já sofreu de invernite aguda?

Beijos primaveris

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